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Nazareth Castellanos, neurocientista: "A maneira como respiramos modifica a atividade cerebral em tempo real"

4 minutos
A especialista explica por que a respiração é fundamental para o cérebro coordenar funções importantes, como atenção e memória.
Nazareth Castellanos, neurocientista: "A maneira como respiramos modifica a atividade cerebral em tempo real"
Última atualização: 15 agosto, 2025

Não percebemos, mas respiramos cerca de 20.000 vezes por dia. É tão automático para nós que raramente paramos um momento para perceber como fazemos isso e o impacto que isso tem em nosso corpo. Mas e se a maneira como respiramos influencia como pensamos, sentimos ou tomamos decisões? Para a neurocientista Nazareth Castellanos, isso não é exagero.

Após mais de duas décadas estudando a relação entre o corpo e o cérebro, ela conclui que a respiração é um dos canais de comunicação mais diretos e poderosos entre os dois. Segundo a especialista, “a maneira como respiramos modifica a atividade cerebral em tempo real”, e isso impacta nosso humor e nossas reações.

A primeira descoberta: respirar pelo nariz muda o cérebro

Um dos primeiros pontos que Castellanos enfatiza é essencial: respirar pela boca não é o mesmo que respirar pelo nariz. Ao respirar pela boca, ignoramos o sistema de filtragem natural do nariz e paramos de ativar vias neurais que são estimuladas apenas pela respiração nasal.

Com este último, ativamos a função de uma estrutura conhecida como bulbo olfatório. Segundo estudos recentes, esse bulbo tem conexão direta com o hipocampo, uma das áreas do cérebro mais importantes para a memória e o aprendizado.

O especialista descreve isso com uma analogia muito clara: a inalação nasal atua como um “marca-passo” que organiza a atividade dos neurônios do hipocampo. Cada inalação os “faseia”, criando uma dinâmica mais ordenada que facilita a atenção e a memória.

Em termos mais simples, é como se a nossa respiração definisse um ritmo interno que permite ao cérebro se coordenar melhor. Isso o ajuda a otimizar melhor seus processos de regulação emocional, concentração e consolidação da memória.

Da respiração à atenção plena

Essa influência direta da respiração no cérebro é precisamente o motivo pelo qual ela se torna uma ferramenta central em práticas como a meditação. A respiração é a ponte, a âncora que conecta nossa intenção voluntária com o complexo mecanismo do cérebro. E é justamente aí que outra estrutura cerebral entra em ação: a ínsula.

Esta, segundo Castellanos, é a região mais impactada pela respiração. Ela funciona como um centro de interocepção, permitindo-nos registrar os sinais internos do nosso corpo, como frequência cardíaca, temperatura, pressão arterial e a própria respiração, e então traduzi-los em emoções e estados de espírito.

Quando meditamos e nossa mente divaga, a ínsula — juntamente com o córtex cingulado — é ativada para nos alertar sobre o nosso lapso. Ao intervir no monitoramento da atenção, ela nos faz perceber que perdemos o foco e que é hora de retornar ao presente. Como se dissesse: “Ei, você se foi!”

É por isso que a respiração consciente é considerada o exercício por excelência para treinar nossa capacidade de atenção. Ela também desmistifica o mito de que a meditação serve para “limpar a mente”, pois, na verdade, nos permite observar com mais clareza e nos ajuda a reconhecer como nos sentimos.

Como usar a respiração para treinar sua mente

Para Castellanos, a meditação não é uma prática de relaxamento, mas sim “plasticidade neuronal direcionada”, ou um esforço consciente para mudar nosso cérebro. No entanto, ele insiste que não podemos ir de cem a zero.

Se tivermos um dia agitado, sentar-se imediatamente para meditar é uma receita para o fracasso, pois o cérebro continua processando a todo vapor. Portanto, a preparação é essencial:

  1. Aterramento do corpo: antes de sentar ou adotar uma posição imóvel, podemos começar com movimentos lentos (como alongamentos suaves ou posturas de ioga). Isso ajudará a relaxar a mente e a desacelerar sua velocidade.
  2. A postura é importante: uma postura ereta, mas relaxada, envia o sinal de “atenção presente” ao cérebro, diferentemente de uma postura sonolenta (curvada) ou tensa (estresse).

Após a conclusão desses exercícios iniciais, prosseguiremos com uma técnica de atenção focada na respiração. Em particular, tentaremos prolongar a expiração. Algumas pesquisas sugerem que pessoas com expirações curtas respondem melhor ao estresse. Portanto, prolongar a duração da expiração por meio da respiração consciente ajuda a acalmar o sistema nervoso.

O treinamento consiste nesta dança:

  • Foco voluntário: levamos nossa atenção para a sensação do ar, com longas exalações.
  • Distração inevitável: a mente divaga. É a sua natureza.
  • “Perceber”: aquele momento em que percebemos que estamos distraídos é o músculo da ínsula trabalhando. Esse é o verdadeiro ato da meditação.
  • O retorno suave: sem frustração ou julgamento, retornamos nossa atenção para sua âncora, nossa respiração.

Agora, é crucial considerar que os efeitos não são percebidos instantaneamente. Como qualquer exercício, a prática faz a diferença. Embora possamos perceber mudanças sutis em 5 dias, o neurocientista ressalta que são necessárias pelo menos 8 semanas de treinamento para alcançar mudanças anatômicas e funcionais significativas.

O resultado desse esforço? Passamos de reagir impulsivamente ao estresse para responder com mais calma e consciência. Mais importante ainda, nossa respiração deixa de ser um simples ato involuntário e se torna nossa melhor aliada quando precisamos nos regular.

Imagem principal: entrevista com Nazareth Castellanos no YouTube @XuanLanYoga

Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.