Madalena, que foi escravizada por 38 anos, receberá como indenização a casa onde trabalhou
Madalena foi escravizada por 38 anos pela família Milagres Rigueira. Durante todo esse tempo, ela prestou serviços sem remuneração e outros direitos trabalhistas, como férias, 13º salário, recolhimento do FGTS e hora extra.
Além disso, ela também era submetida a situação de maus-tratos e abandono. A relação de exploração com a família Milagres Rigueira começou quando Madalena tinha 8 anos. Durante 23 anos, ela trabalhou na casa de Maria das Graças, mãe de Dalton. Nos 15 anos seguintes, passou a servir o filho.
Ela morava com os patrões, não tinha registro em carteira nem salário mínimo garantido ou descanso semanal remunerado.
Madalena dormia em um cômodo de seis metros quadrados feito para ser um depósito. Sem janela, era lá que ela fazia suas refeições, se levantava às 2h da manhã e se recolhia às 20h, quando parava de trabalhar.
Ela se casou em 2001, um matrimônio arranjado pelos Milagres Rigueira de olho na saúde debilitada do ex-militar Marino Lopes da Costa, um tio da família. A família passou a administrar o dinheiro recebido por Madalena assim que o ex-combatente faleceu em 2003. Em entrevista, Madalena declarou nunca ter morado com Costa e que não tinha conhecimento da pensão a que tinha direito.
Madalena fechou um acordo com a família
O acordo leva em conta apenas a relação trabalhista e tinha como réus o professor universitário Dalton Milagres Rigueira, sua esposa, Valdirene Lopes Rigueira, e as filhas do casal, Bianca Lopes Milagres Rigueira e Raíssa Lopes Fialho Rigueira.
A família também é investigada pelo MPF pelo crime de submeter Madalena a condições análogas à escravidão.
Madalena cobrava na Justiça o pagamento de R$ 2.244.078,81 em direitos trabalhistas. Durante audiência virtual no Tribunal Regional do Trabalho da terceira região em Patos de Minas, ela aceitou a proposta oferecida no valor de R$ 690.100.
Diferente de casos anteriores, o pagamento não será feito em dinheiro. O pagamento da indenização de Madalena será feito através da entrega do apartamento da família, local em que ela viveu durante os últimos 15 anos.
O imóvel está avaliado em R$ 600 mil, mas possui uma dívida em financiamento no valor de R$ 180 mil, com a qual Madalena terá de arcar. Ela também ficará com um carro da marca Hyundai, no valor de R$ 70 mil, e uma quantia de mais R$ 20 mil.
Segundo a defesa de Madalena, este foi o maior acordo na história do MPT-MG sobre relações de trabalho análogos a escravidão.
De acordo com a área de inspeção do trabalho do governo federal, porém, o maior valor pago em verbas rescisórias a trabalhadores resgatados da escravidão contemporânea ocorreu após uma operação no Rio de Janeiro. As duas vítimas receberão juntas R$ 655,2 mil (uma teve direito a R$ 364,5 mil e a outra a R$ 290,7 mil) mais R$ 20 mil cada por dano moral individual.
Vida nova
Além da indenização, Madalena também receberá uma pensão por ter sido casada com Marino Lopes da Costa, ex-combatente da Segunda Guerra Mundial.
Assim que conseguiu se desvencilhar da família Milagres Rigueira, ela descobriu que cinco empréstimos consignados foram feitos em seu nome, o que resultava em um desconto de R$ 5 mil por mês.
Em junho, os advogados de Madalena conseguiram entrar em acordo com os bancos e os descontos vão cessar. Com isso, ela poderá receber de forma integral a pensão de R$ 8,4 mil. Antes disso, o dinheiro de Madalena ajudava a pagar a faculdade de Medicina de uma das filhas do casal.
Felizmente, Madalena vive uma vida bem diferente hoje. No entanto, à época da entrevista ela ainda não tinha definido como seria a sequência da sua vida. No momento, vivia com a conselheira tutelar Taís Teófilo em Uberaba (MG). E, por conta da pandemia da Covid-19, ela ainda não tinha reencontrado os familiares, que vivem em São Miguel do Anta, interior de Minas Gerais.
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