Lésbicas tardias: as mulheres que descobrem novos prazeres depois dos 30
Sabemos que o tempo é relativo: cada pessoa tem seu próprio processo de descoberta e amadurecimento. Mesmo assim, o termo cunhado na década de 1980 como late-blooming lesbians (lésbicas tardias) vem se tornado motivo de cada vez mais interesse e debate público.
A sociedade como um todo tem fortalecido o entendimento que o momento da vida em que a mulher se descobre lésbica (mesmo depois de anos vivendo uma vida heteronormativa) pode acontecer a qualquer idade.
Também existe toda uma escala de experiências que não se encaixam exatamente no conceito de se descobrir como lésbica, mas sim bissexual, como o caso da atriz Maitê Proença que aos 64 anos se entregou a uma história de amor com a cantora Adriana Calcanhoto, mas ainda se sente atraída por homens.
O conceito de lésbicas tardias tem ajudado muitas mulheres que estão vivendo essa fase. A professora Joana Ziller, Coordenadora do Grupo de Estudos em Lesbianidades da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que os relatos de mulheres que começaram relacionamentos homoafetivos depois dos 30 se tornam mais comuns de maneira proporcional à quebra de preconceitos contra pessoas LGBTQIA+.
De acordo com Ziller, não existe uma explicação concreta e definitiva para o fato de as mulheres começarem a sentir atração por outras em idades mais maduras, pois cada caso é único. No entanto, como outras formas de se relacionar além da heteronormativa têm se tornado cada vez mais aceitas, mais e mais mulheres se sentem seguras em experimentar novas relações.
“O termo late-blooming lesbians chega a ser poético por representar uma mulher que floresce como lésbica após a juventude. Mas, como quase tudo relacionado à sexualidade humana, não há resposta para esse fenômeno. É muito importante se questionar: o desejo floresceu realmente depois dos 30 anos ou a heteronormatividade foi tamanha que impossibilitou de se pensar no assunto?”, questiona Joana.
Alguns relatos de lésbicas tardias
A atriz Maitê Proença atualmente está em cartaz com a peça de teatro O pior de mim, na qual revisita alguns momentos marcantes de sua própria vida. O espetáculo, que é uma obra autobiográfica, tece comentários sobre homens e machismo através do ponto de vista de Maitê.
Em uma entrevista concedida à revista Quem, a atriz comentou sobre o relacionamento assumido recentemente com Adriana Calcanhoto. Ela diz que ainda se sente interessada por homens e que apenas se encantou por Adriana, que é lésbica. E isso é tudo.
A liberdade de relacionamento se reflete em diversas outras mulheres além de Maitê. A psicóloga Maria Rita Lemos se descobriu lésbica aos 50 anos, depois de 30 se relacionando apenas com homens. Atualmente, ela tem 74 e comenta que vivia uma vida “nos moldes tracionais”, se casando jovem, tendo duas filhas e, após se tornar viúva, se relacionando novamente com outro homem e se sendo mãe mais uma vez.
Ela relata que nunca havia passado por sua cabeça a possibilidade de um relacionamento com outra mulher. Mas tudo mudou no dia 16 de outubro de 1998, quando ela conheceu a motorista de aplicativo Fulvia Margotti, atualmente com 60 anos, através de um bate-papo virtual. O sentimento foi tão profundo que elas estão juntas até hoje, estando casadas há 24 anos.
“Eu me apaixonei pela foto de perfil dela. Ela estava de farda e segurando um cachorrinho. A Fulvia tinha tudo o que eu procurava, mas eu não sabia como seria nossa conexão física presencialmente, porque nunca tinha tido experiência com outra mulher. Quando nos vimos e ela encostou no meu braço no carro, me arrepiei toda.”
Atualmente, Maria Rita gosta de contar em detalhes sua experiência para ajudar a desconstruir a sensação de culpa que outras mulheres sentem ao se perceberem atraídas por uma pessoa do mesmo sexo. Apesar de Fulvia ter sido sua única experiência homoafetiva, a psicóloga comenta que não sentiu nenhum tipo de apreensão em relação a fluidez de sua orientação sexual.
“Minha esposa me satisfaz em todos os sentidos da vida. O companheirismo é total e a vida sexual melhorou. Não gosto de rótulos. Desde que nos conhecemos, não tive mais interesse por homens e nem por outra mulher.”
Infelizmente, para outras pessoas a descoberta da própria sexualidade não foi uma experiência tão tranquila. Esse é o caso da aposentada Willman Defacio, de 74 anos, que aos 38 percebeu que se sentia sexualmente atraída por outras mulheres. Na época, ela acabou vencida pelo preconceito, de forma que acreditou não haver espaço para um relacionamento homoafetivo em sua vida.
Mas tudo mudou durante seu processo de divórcio, quando ela descobriu que estava interessada em uma colega de trabalho. Foi então que tudo ficou claro para ela: Willman nunca se sentiu realizada em seus relacionamentos anteriores porque na verdade ela gostava de mulheres. Ela completará 28 anos de casamento com Angela Fontes neste ano e atualmente se considera uma pessoa muito feliz.
“Eu sabia que não sentia prazer com o meu ex-marido, mas não entendia o motivo. Depois dessa experiência, só me relacionei com mulheres e hoje tenho a sorte de dividir a vida com a Angela.”, conta Willman, que não teve problemas em contar sobre sua descoberta para a família.
Devido à descoberta tardia de sua orientação sexual, grande parte das lésbicas tardias já foi casada com homens, e muitas vezes são mães. Segundo a psicóloga Fabiana Esteca, que estuda gênero e sexualidade humana, esse processo de descoberta exige autoconhecimento e independência para superar todas as barreiras sociais. Muitas vezes apenas com uma certa maturidade é possível encarar essa situação. É como se elas vivessem uma segunda adolescência, descobrindo facetas de sua personalidade.
“Depois dos 30 existe um amadurecimento afetivo sexual, uma apropriação do próprio corpo. Elas se permitem experimentar outros tipos de relacionamentos e se encontram. Existe também uma parcela que tem uma sexualidade fluida e vai sentir atrações diferentes ao longo da vida.” Diz Fabiana. Ela ainda observa que é muito importante que essas mulheres sejam acolhidas por seus familiares e amigos.
As lésbicas tardias construíram sua identidade social com base na heterossexualidade. Ao se assumirem como lésbicas, muitas delas enfrentaram julgamentos, sendo consideradas farsantes, como se estivessem se escondendo por todos esses anos, o que não é verdade de forma alguma. Todos nós percebemos comportamentos e preferências surpreendentes em diferentes momentos da nossa vida.
Além disso, essa atitude é bastante negativa para a saúde psicológica dessas mulheres que, ao serem julgadas, muitas vezes passam a duvidar de sua sexualidade, o que pode provocar conflitos internos graves.
Sabemos que o tempo é relativo: cada pessoa tem seu próprio processo de descoberta e amadurecimento. Mesmo assim, o termo cunhado na década de 1980 como late-blooming lesbians (lésbicas tardias) vem se tornado motivo de cada vez mais interesse e debate público.
A sociedade como um todo tem fortalecido o entendimento que o momento da vida em que a mulher se descobre lésbica (mesmo depois de anos vivendo uma vida heteronormativa) pode acontecer a qualquer idade.
Também existe toda uma escala de experiências que não se encaixam exatamente no conceito de se descobrir como lésbica, mas sim bissexual, como o caso da atriz Maitê Proença que aos 64 anos se entregou a uma história de amor com a cantora Adriana Calcanhoto, mas ainda se sente atraída por homens.
O conceito de lésbicas tardias tem ajudado muitas mulheres que estão vivendo essa fase. A professora Joana Ziller, Coordenadora do Grupo de Estudos em Lesbianidades da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que os relatos de mulheres que começaram relacionamentos homoafetivos depois dos 30 se tornam mais comuns de maneira proporcional à quebra de preconceitos contra pessoas LGBTQIA+.
De acordo com Ziller, não existe uma explicação concreta e definitiva para o fato de as mulheres começarem a sentir atração por outras em idades mais maduras, pois cada caso é único. No entanto, como outras formas de se relacionar além da heteronormativa têm se tornado cada vez mais aceitas, mais e mais mulheres se sentem seguras em experimentar novas relações.
“O termo late-blooming lesbians chega a ser poético por representar uma mulher que floresce como lésbica após a juventude. Mas, como quase tudo relacionado à sexualidade humana, não há resposta para esse fenômeno. É muito importante se questionar: o desejo floresceu realmente depois dos 30 anos ou a heteronormatividade foi tamanha que impossibilitou de se pensar no assunto?”, questiona Joana.
Alguns relatos de lésbicas tardias
A atriz Maitê Proença atualmente está em cartaz com a peça de teatro O pior de mim, na qual revisita alguns momentos marcantes de sua própria vida. O espetáculo, que é uma obra autobiográfica, tece comentários sobre homens e machismo através do ponto de vista de Maitê.
Em uma entrevista concedida à revista Quem, a atriz comentou sobre o relacionamento assumido recentemente com Adriana Calcanhoto. Ela diz que ainda se sente interessada por homens e que apenas se encantou por Adriana, que é lésbica. E isso é tudo.
A liberdade de relacionamento se reflete em diversas outras mulheres além de Maitê. A psicóloga Maria Rita Lemos se descobriu lésbica aos 50 anos, depois de 30 se relacionando apenas com homens. Atualmente, ela tem 74 e comenta que vivia uma vida “nos moldes tracionais”, se casando jovem, tendo duas filhas e, após se tornar viúva, se relacionando novamente com outro homem e se sendo mãe mais uma vez.
Ela relata que nunca havia passado por sua cabeça a possibilidade de um relacionamento com outra mulher. Mas tudo mudou no dia 16 de outubro de 1998, quando ela conheceu a motorista de aplicativo Fulvia Margotti, atualmente com 60 anos, através de um bate-papo virtual. O sentimento foi tão profundo que elas estão juntas até hoje, estando casadas há 24 anos.
“Eu me apaixonei pela foto de perfil dela. Ela estava de farda e segurando um cachorrinho. A Fulvia tinha tudo o que eu procurava, mas eu não sabia como seria nossa conexão física presencialmente, porque nunca tinha tido experiência com outra mulher. Quando nos vimos e ela encostou no meu braço no carro, me arrepiei toda.”
Atualmente, Maria Rita gosta de contar em detalhes sua experiência para ajudar a desconstruir a sensação de culpa que outras mulheres sentem ao se perceberem atraídas por uma pessoa do mesmo sexo. Apesar de Fulvia ter sido sua única experiência homoafetiva, a psicóloga comenta que não sentiu nenhum tipo de apreensão em relação a fluidez de sua orientação sexual.
“Minha esposa me satisfaz em todos os sentidos da vida. O companheirismo é total e a vida sexual melhorou. Não gosto de rótulos. Desde que nos conhecemos, não tive mais interesse por homens e nem por outra mulher.”
Infelizmente, para outras pessoas a descoberta da própria sexualidade não foi uma experiência tão tranquila. Esse é o caso da aposentada Willman Defacio, de 74 anos, que aos 38 percebeu que se sentia sexualmente atraída por outras mulheres. Na época, ela acabou vencida pelo preconceito, de forma que acreditou não haver espaço para um relacionamento homoafetivo em sua vida.
Mas tudo mudou durante seu processo de divórcio, quando ela descobriu que estava interessada em uma colega de trabalho. Foi então que tudo ficou claro para ela: Willman nunca se sentiu realizada em seus relacionamentos anteriores porque na verdade ela gostava de mulheres. Ela completará 28 anos de casamento com Angela Fontes neste ano e atualmente se considera uma pessoa muito feliz.
“Eu sabia que não sentia prazer com o meu ex-marido, mas não entendia o motivo. Depois dessa experiência, só me relacionei com mulheres e hoje tenho a sorte de dividir a vida com a Angela.”, conta Willman, que não teve problemas em contar sobre sua descoberta para a família.
Devido à descoberta tardia de sua orientação sexual, grande parte das lésbicas tardias já foi casada com homens, e muitas vezes são mães. Segundo a psicóloga Fabiana Esteca, que estuda gênero e sexualidade humana, esse processo de descoberta exige autoconhecimento e independência para superar todas as barreiras sociais. Muitas vezes apenas com uma certa maturidade é possível encarar essa situação. É como se elas vivessem uma segunda adolescência, descobrindo facetas de sua personalidade.
“Depois dos 30 existe um amadurecimento afetivo sexual, uma apropriação do próprio corpo. Elas se permitem experimentar outros tipos de relacionamentos e se encontram. Existe também uma parcela que tem uma sexualidade fluida e vai sentir atrações diferentes ao longo da vida.” Diz Fabiana. Ela ainda observa que é muito importante que essas mulheres sejam acolhidas por seus familiares e amigos.
As lésbicas tardias construíram sua identidade social com base na heterossexualidade. Ao se assumirem como lésbicas, muitas delas enfrentaram julgamentos, sendo consideradas farsantes, como se estivessem se escondendo por todos esses anos, o que não é verdade de forma alguma. Todos nós percebemos comportamentos e preferências surpreendentes em diferentes momentos da nossa vida.
Além disso, essa atitude é bastante negativa para a saúde psicológica dessas mulheres que, ao serem julgadas, muitas vezes passam a duvidar de sua sexualidade, o que pode provocar conflitos internos graves.
Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.